Escola Sem Partido: Um desafio a ser enfrentado
COLUNA |
Opinião
Ana
Maria Louzada*
Vivemos tempos de significativos
desafios, que precisam ser discutidos incansavelmente pela sociedade, no
sentido de primar por uma educação transformadora, que forme consciências
críticas, e, que para tal, necessário se faz promover debates no contexto
escolar.
Sim! Debates que insiram
os(as)estudantes num processo de reflexão sobre o contexto político em que
vivemos, até porque os conhecimentos escolares não são neutros. Por isso, se
forem ignorados com foco apenas na dimensão técnica do processo de ensino
aprendizagem, como requer a Escola Sem Partido, podemos produzir mentes aprisionadas.
Não podemos cair na armadilha de
a escola contribuir com a adaptação dos(as) estudantes ao mercado de
trabalho), mas de assegurarmos a sua inserção no espaço tempo em que vivemos. O processo de inserção pressupõe a formação
de sujeitos comprometidos com as mudanças que são fundamentais para a
transformação do mundo.
Sendo assim, sugerimos a leitura da
reportagem a seguir, no sentido de análise sobre os perigos que hoje se fazem
presentes na proposta de implementação de uma educação que ao invés de promover a emancipação da sociedade e de garantir a interlocução entre escola e família, instiga questões que podem comprometer a qualidade da educação que tanto sonhamos e lutamos nas últimas décadas.
Versão mais rigorosa do Escola Sem Partido é apresentada na Câmara
Texto coloca como direito dos
alunos gravar as aulas e proíbe grêmios estudantis de fazerem 'atividade
político-partidária'
No primeiro dia de trabalhos
legislativos no Congresso, uma nova versão do projeto Escola Sem Partido foi
apresentada pela deputada Bia Kicis (PSL-DF). Mais rigoroso, o texto
protocolado na segunda-feira (04) coloca como direito dos alunos gravar as
aulas, cria um canal para denúncias anônimas sobre o descumprimento da lei que
deverão ser apuradas pelo Ministério Público e proíbe grêmios estudantis de
fazerem "atividade político-partidária".
O texto da deputada, que é do
mesmo partido o presidente Jair Bolsonaro, também aumentou o tamanho do cartaz
com uma lista de "deveres do professor" que deve ser afixado, segundo
o projeto, nas salas de aula: de 29,7 cm de largura por 21 cm de altura, passou
agora para 42 cm por 59,4 cm. Destruir parcial ou totalmente esses cartazes ou
não os colocar nas paredes será considerado ato de "improbidade
administrativa", segundo o projeto atual.
Bia Kicis fez essas inclusões na
redação da matéria e manteve outros dispositivos que já estavam presentes no
projeto, arquivado em dezembro, com o fim da legislatura, após a comissão
especial que o analisava não conseguir votá-lo. Permaneceu na proposta, por
exemplo, o artigo dizendo que o "Poder Público não se imiscuirá no processo
de amadurecimento sexual dos alunos nem permitirá qualquer forma de dogmatismo
ou proselitismo na abordagem das questões de gênero".
Para a deputada, o novo texto não
impede que assuntos como gênero e sexualidade sejam abordados, mas apenas diz
que não pode haver proselitismo sobre esses temas.
— Ficamos dois anos debatendo o
projeto na Câmara e fizemos uma limpeza no que poderia ser melhorado. No caso
da ideologia de gênero, falava-se que não poderia tratar do assunto, tiramos e
colocamos que não poderá ser feito qualquer tipo de proselitismo em abordar
questão de gênero, mas todo assunto pode ser tratado levando em consideração o
amadurecimento sexual dos alunos — diz ela.
Questionada sobre dispositivos que
protejam os professores de perseguições, a deputada afirmou que o projeto
pretende apenas garantir o "direito das crianças".
— Não há nenhum tipo de
perseguição a professores, o que queremos é proteger as crianças para que sejam
tratadas com respeito e que seja prestigiada a liberdade de crença prevista na
Constituição.
Reação à matéria
A deputada Tábata Amaral
(PDT-SP), que articula uma frente pela Educação na Casa, teme que o Escola Sem
Partido sequestre a pauta e impeça a discussão de matérias relevantes para a
área.
— Quem é da área da Educação
entende que o projeto em si não é um risco, porque no fim das contas ele não
vai passar e, se passar, vai ser derrubado pelo STF. Mas temos a preocupação de
que pautas ideológicas como essa tomem o espaço do debate — afirma a deputada.
— Sempre ficamos pensando quem vai ser o próximo deputado que vai trazer isso
para a pauta, fazer burburinho e vamos perder um mês de debate sobre o Fundeb,
sobre formação de professores.
A deputada Erika Kokay (PT-DF), que
participou das discussões do projeto que foi arquivado no ano passado, afirmou
que já havia expectativa de que tentariam reviver a proposta.
— Esse projeto parte de uma
política de quem quer negar a democracia no Brasil. O país não pode permitir o
retrocesso. É preciso ter na escola um espaço de proteção e construção de
pensamento crítico.
Confira cinco novidades do
projeto:
1) Gravação de aulas
O novo projeto prevê
expressamente que os alunos gravem as aulas.
"É assegurado aos estudantes
o direito de gravar as aulas, a fim de permitir a melhor absorção do conteúdo
ministrado e de viabilizar o pleno exercício do direito dos pais ou
responsáveis de ter ciência do processo pedagógico e avaliar a qualidade dos
serviços prestados pela escola."
2) Limite aos grêmios
A nova redação estabelece que os
grêmios estudantis não façam "atividade político-partidária"
"É vedada aos grêmios
estudantis a promoção de atividade político-partidária."
3) Tamanho do cartaz
O tamanho dos cartazes a serem
afixados nas escolas, com os "deveres do professor", aumentou no
projeto novo. Antes, a dimensão era de 29,7 cm de largura e 21 cm de altura.
Agora, passou para 42 cm e 59,4 cm, respectivamente.
"As instituições de educação
básica afixarão nas salas de aula e nas salas dos professores cartazes com o
conteúdo previsto no anexo desta Lei, com, no mínimo, 420 milímetros de largura
por 594 milímetros de altura e fonte com tamanho compatível com as dimensões
adotadas."
4) Punição
Não cumprir o dispositivo de afixar
os cartazes, bem como removê-los ou destrui-los parcial ou totalmente é
considerado "ato de improbidade" no novo projeto.
"Configura ato de
improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração
pública o descumprimento do disposto no art. 5º desta Lei, bem como a remoção
indevida ou a destruição total ou parcial dos cartazes ali referidos."
5) Canal de reclamações
O projeto estabelece que o poder
público criará um canal de reclamações, assegurado o anonimato, sobre descumprimento
da lei. Essas reclamações deverão ser encaminhadas ao Ministério Público para
apuração.
"O Poder Público contará com
canal de comunicação destinado ao recebimento de reclamações relacionadas ao
descumprimento desta Lei, assegurado o anonimato.
Parágrafo único. As reclamações
referidas no caput deste artigo deverão ser encaminhadas ao órgão do Ministério
Público incumbido da defesa dos direitos da criança e do adolescente, sob pena
de responsabilidade."
_____
*Ana Maria Louzada: Mestre em
Educação/UFES, Orientadora Educacional, Consultora de Família, Palestrante e
Autora de vários livros e artigos sobre assuntos relacionados à Educação - amlouzadaconsultoria@gmail.com
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